quinta-feira, 14 de abril de 2016


O gandula que comeu a bola

 
Mais de meia hora de jogo, e a bola não saíra, uma vez sequer, pela linha de fundos. Tinha escapado inúmeras vezes pelas laterais, o que já estava irritando aquele gandula que trabalhava atrás do gol. Logo naquele dia, coitado, que o irmão mais velho assistia ao jogo da geral, só para vê-lo atuar mais de perto.

Por isso o menino gritava com os atacantes que chutavam daquele lado, toda vez que a bola rondava a área:

– Chuta aqui, seu pereba! Chuta logo essa porcaria!

Esbravejava com os zagueiros quando evitavam as finalizações do adversário, e xingava o goleiro, toda vez que este fazia uma defesa:

– Bota pra escanteio! Bota pra escanteio!

           Finalmente a bola desviou em alguém e escapuliu pela linha de fundos, quase no final do primeiro tempo. O menino correu até o fosso em volta do campo, pegou a bola com as duas mãos, abraçou, alisou e rolou com ela pela grama.

O gandula estava visivelmente se exibindo para o irmão, alheio aos gritos dos torcedores, dos jogadores e até do juiz. Todos esperavam apenas que o gandula fizesse o seu trabalho, para que o jogo pudesse recomeçar.

– Devolve essa bola, moleque insolente! – berrou o dirigente do time que estava

perdendo o jogo.

– Vem até aqui pegar! – desafiou o menino, correndo de um lado para o outro com a bola debaixo do braço.

O dirigente chamou os auxiliares e os seguranças. Veio também a polícia, para engrossar a perseguição, diante dos gritos da torcida que, a essa altura, torcia pelo gandula, rindo e aplaudindo a sua aventura.

Quando se viu finalmente acuado em um canto, espremido entre o pau da bandeira e o muro do fosso de proteção, o gandula tirou um pequeno canivete do bolso e começou a cortar a bola, gomo após gomo, colocando de um em um na boca como se fossem bifes bem finos.

Mastigando, engolindo e dando boas gargalhadas diante de seus perseguidores.