O prejuízo
Meu pai perguntou por que você fez isto? e não perguntou mais nada. Não
respondi coisa alguma nem sabia o que responder. Fiquei olhando ora para a
parede, ora para o telhado, morrendo de vergonha.
Meu pai entrou no banheiro, sem me olhar, mijou e fez a barba, depois
saiu de lá novamente sem olhar para mim. Sentou para tomar café da manhã, sem
me chamar, como sempre fazia. Eu não aguentava mais o peso do seu silêncio,
quando ele resolveu abrir a boca ainda cheia de café com leite e cuscuz, para
desabafar, entre enraivecido e queixoso:
– Vou ter que trabalhar o final de semana inteiro, fazer hora extra,
para poder pagar a vidraça do seu Nestor que você destruiu, moleque.
Aí criei coragem e disse não precisa, quem vai pagar a vidraça sou eu.
Meu pai me olhou indiferente e incrédulo, como se olhasse para uma
parede que fala, e tomei a dianteira antes que ele dissesse qualquer coisa:
– Deixe, pai. Vendo meu time de botão, vendo laranja descascada na porta
de casa, e pago essa merda.
Meu pai arregalou os olhos e depois desamarrou a cara. Abriu um sorriso
que até hoje lembro como o mais bonito que já vi na cara do meu pai. Só não sei
se foi porque eu disse que pagava o prejuízo ou se foi por causa do essa merda.
(O homão e o menininho. Editora Abacate, 2010. Programa Nacional Biblioteca da Escola 2013)
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